Já alguma vez estiveste em situações em que independentemente das escolhas que fazes terminas sempre num beco sem saída? Voltas para trás, fazes outra escolha até perceberes que acabaste de encontrar outro caminho sem saída. Em outras alturas, andas para trás e para a frente, entre o final do caminho e a única saída aparentemente possível e familiar, que não queres voltar a percorrer. É como um "sempre em pé" que nunca chega a cair, mas também não sai do mesmo lugar.
Senti exatamente isto num treino de corrida pelas Salinas de Tavira, divertindo-me com a ironia da vida. Nas mais pequenas coisas, encontramos as metáforas mais incríveis e esclarecedoras, recheadas de ensinamentos e também lugares comuns.
Porque é que tantas vezes na vida nos sentimos imobilizados, neste conflito entre o desconforto do desconhecido e o conforto do familiar, ainda que disfuncional?
A principal razão é o medo.
Da mesma forma que nascemos aptos a explorar e a descobrir, também temos um instinto natural para procurarmos a segurança. E o nosso cérebro confunde segurança com conforto. Um conforto que tantas vezes é bloqueador.
Se algo nos faz sentir conforto - através da familiaridade, acessibilidade e coerência - o nosso cérebro sinaliza que estamos bem onde estamos, não precisamos sair. Mesmo que esse "aparente conforto" signifique viver situações que nos causem sofrimento mas que são contudo familiares, previsíveis. E assim, ficamos presos aos nossos "caminhos sem saída".
Quando por outro lado sentimos algo como novo, difícil ou mesmo que ligeiramente incoerente, o medo entra em ação, aparecendo de todos os feitios e tamanhos. Assume por vezes a forma de procrastinação, perfeccionismo, isolamento, "ataque ao mundo" ou vitimização. O medo, é o mestre do disfarce! E a sua linguagem é limitada a NÃO: "Não vou fazer nada, não vale a pena." "Não vou a esse sítio, não conheço ninguém." "Não, isso não é para mim." "Não, agora não é uma boa altura." Etc...
E estes discursos sentam-se confortavelmente nos nossos espaços seguros, reforçando a ideia de que estamos bem onde estamos. Como um "sempre em pé" em versão Matriosca. Que contém muitas versões si em si mesmo, da mais pequena à maior, bem ensaiadas nos seus movimentos mais ou menos amplos, mas sempre no mesmo sítio.
O que fazer então?
Aprender a olhar para as coisas de ângulos diferentes. É uma das formas mais simples, acessíveis e eficazes de transformar as nossas vidas. É a base de todos os mind hacks que exploro neste blog. Imagina que deves dinheiro a alguém; ou que tens uma dívida de décadas com o teu banco sobre as prestações da tua casa. A maior parte de nós sente o peso da pressão e responsabilidade e às vezes até desconforto por essa dívida. "Não posso falhar os pagamentos, tenho que ter dinheiro suficiente." Imagina que mudas a tua perspectiva para "ter esta dívida, é um voto de confiança de quem me emprestou o dinheiro e é uma oportunidade para provar a minha credibilidade e capacidade de assumir compromissos." Se assumires esta perspectiva, o que muda? Como é que te sentes? Onde passará a estar o teu foco? Na preocupação com a falha ou na crença do alcance, na competência?
As nossas vidas felizmente estão inundadas de oportunidades de reaprendizagem se nunca deixarmos de nos desafiar. Os caminhos sem saída estão recheados de alternativas nem sempre visíveis, óbvias ou fáceis, mas possíveis. Como na fotografia em destaque. Posso pensar que este caminho não tem saída, ou mudar a perspectiva para "Este caminho não tem saída para carros. E se for a pé?" Frequentemente, os sinais que recebemos do exterior, com todo o seu valor, tanto podem abrir caminho como condicionar a nossa perspectiva de possibilidade.
Vygotsky introduziu o conceito das zonas de desenvolvimento optimal que se refere à distância entre o nosso nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial. Ou seja, se conseguirmos funcionar num nível de tensão positiva entre a nossa competência e o desafio, criamos oportunidades para (re)aprender, crescer e seguir caminho. É como se colocássemos pernas na Matriosca. Consegues imaginar o que cada uma das bonecas faria se lhe fosse dada a possibilidade de cair? É seguramente uma das consequências de termos pernas.
A ideia é desafiarmos sempre o que entendemos como certo e confortável. Principalmente se a familiaridade desse conforto nos está a manter insatisfeitos, bloqueados ou sufocados, como quando estamos em relacionamentos disfuncionais ou abusivos, quando temos hábitos de vida pouco saudáveis como o sedentarismo, ou se permanecemos em empregos negativamente stressantes e incapacitantes.
A percepção de desafio é diferente para cada pessoa. Eu precisei de fazer um ultra trail de 60 Km para ativar a minha passagem para outros caminhos. Mas outras pessoas, podem conseguir exatamente o mesmo efeito com um passeio na sua rua. Basta sentirmos a dúvida e o desconforto relacionados com esse novo desafio para sabermos que estamos no caminho certo. Desde que alinhado com aquilo que valorizamos. E este, será um tema para outro post!
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Queres reaprender a tua relação com o medo? Subscreve a minha newsletter semanal Conversas com o Medo
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Que post fantástico.Ando a pensar onde reside o meu medo à já vários dias, talvez anos! Gosto de pensar que os sinais estão sempre lá, desde que, estejamos abertos para os receber. Ler o seu post leva-me a acreditar que estou no caminho certo e é tão bom encontrar 'sinais' como este, que nos indicam que a solução está e estará sempre em nós, pelo menos no que toca ao que dentro da esfera da nossa de responsabilidade.
ResponderEliminarObrigada Katia, vou partilhar!
Olá Guida, muito obrigada pelo comentário. Fico mesmo contente que este post esteja a ajudar a desbravar os caminhos e a encontrar as respostas!
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